quarta-feira, 27 de maio de 2015

Para os Corações Partidos (parte 2)

Continuando uma série de palavras que, para você que sofre de amor, não ajudarão tanto quanto eu espero que ajudem

Parte 2 - Como continuar envenenado

Apaixonar-se é como pedir algo emprestado a alguém, pedir que tomem conta do seu lugar enquanto você vai até ali ou pedir que alguém te dê uns tapas nas costas antes de chamar o SAMU porque você está engasgado com algo mais seco que Pipoteca. São coisas da vida: Por mais que ninguém dependa disso em questão para a vida prosseguir e terminar, são coisas quase tão certas e inescapáveis quanto as rugas na sua cara ou os filmes da Xuxa.

Escolhas não são atos isolados. Elas pesam com responsabilidade. E pesam porque responsabilidade não é coisa passageira. É um uso de investimentos passados e um ato de se assumir riscos para o futuro. Optar, escolher, decidir... Se você, ao fazer isso, está com a cabeça só no presente, está mais exposto às surpresas da vida, essa menina travessa que mexe com quem está quieto.

Apaixonar-se, então, mesmo que não seja uma decisão, forçará você a usar mais o seu coraçãozinho do que seus neuroniozinhos acham cabível, e logo você estará tomando decisões que o levarão a se expor a grandes alegrias ou a terríveis decepções - em ambos os casos, a emoção será grande e marcante porque excederá suas expectativas e até mesmo sua imaginação de apaixonado(a).

Porém, em se tratando de assumir riscos, o chute, o fora, o chifre, a decepção, a desilusão, a quebra de cara, a mágoa, enfim, todo o falecimento do amor está na linha miúda do contrato que você assina quando diz sim pra outra pessoa e ela diz o sinzinho dela também. O relacionamento começa para durar e para as pessoas serem felizes. A vida na dimensão da realidade fatual é que não colabora...

Ao invés de listar mil e um motivos para determinar o que destruiu seu sonho de continuar ou melhor o relacionamento, e para evitar ficar listando mil e dois motivos para continuar insistindo ou mil e três motivos para tentar voltar (e, sobretudo, evitar ter mil e quatro esperanças de que as coisas vão se remendar magicamente), é bom botar a razão para funcionar. E, sendo racional, a hora passará a ser de listar alguns motivos para seguir em frente, motivos para encarar que a relação acabou, motivos para traçar novos planos para as horas do dia agora que é bem provável que o seu amor se foi. Ficar perdido nos devaneios do chute, é claro, em nada ajudará.

Mas aí vem a grande questão que merece a caixa-alta. SOFRER POR AMOR É UMA FORMA DE CONTINUAR APAIXONADO. Você tinha aquele vínculo tão lindo, tão doce e perfumado com a pessoa... Sentia-se até capaz de loucuras por ela, e por mais idiota que fosse pensar como seria bom e agradável viajar, fazer compras no supermercado ou ver filmes com a pessoa, o sentimento fazia bem. O vínculo era o poço que trazia a água. E de repente o vínculo se acaba. O poço não seca, você apenas não tem acesso a ele. A água continua lá. Tudo o que você passa a pensar é que morrerá de sede, que só aquela água é que matava sua sede, que a situação tem que ser contornada ou já era.
E por mais que essa cegueira momentânea e privação da capacidade de se salvar durem por um tempo preocupante em muitos casos, imagino que o principal veneno é, nessas horas, a esperança ilusória de que a pessoa que se foi magicamente voltará. Ou que ela esquecerá o que você fez e trará mil perdões consigo. E que, recomeçando a relação perdida, tudo será tão bom ou melhor quanto antes.

Se for para imaginar, imagine como seria barrenta a água de um poço arruinado, mesmo que você conseguisse cavar com as mãos para chegar até a água. Imagine como seria voltar para a pessoa ou a pessoa voltar para você. E, por mais que você imagine coisas boas, faça o exercício de imaginar como seria a confiança e o sentimento de segurança no relacionamento após esse retorno que brinca na sua imaginação. Como seria voltar a mostrar o pescoço para alguém que cravou a faca ali enquanto a ferida ainda nem fechou?

Wicked me, mas se a pessoa decidiu partir, parta também. Corte o vínculo. Desfaça-se de que se desfez de você. Esqueça quem considera te esquecer. Não crie caso por quem te achou dispensável e não vá atrás de quem optou por largar você. E não é uma questão de orgulho, porque de nada adiantaria ficarem sentados sozinhos, você e seu orgulho, enquanto sua vontade for correr até os braços de seu amor para que se beijem sob a chuva ou sob o pôr-do-sol.

Já que aquela cena linda do grande beijo público de vocês reatando ao som de aplausos e risos emocionados das pessoas ao redor não vai acontecer, esforce-se em livrar-se e purgar-se dessa coisa tóxica que fica impregnada no seu corpo quando a pessoa amada diz adeus. Toda a devoção que você tinha para entregar para essa pessoa vira o veneno que lhe fará continuar sofrendo com a expectativa da pessoa voltar. E, contando que ela não volte, esse veneno destruirá pouco a pouco a sua capacidade de imaginar como você poderá ser feliz com outras pessoas ou só consigo daqui a pouco tempo. Vai minando suas forças que você poderia estar usando desde já para reorganizar a sua vida agora que o seu benzinho disse adeus e não te liga.

Os Deuses gregos têm ícor correndo junto ao sangue de suas veias. É uma substância tóxica, fatal para os mortais. Caso um mortal um dia derramasse o sangue de um deles, morreria por causa disso. Feridas abertas de Afrodite deitam veneno também. Mas se Asclépio demonstrou algo, é que para todo mal existe uma cura.

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