segunda-feira, 28 de setembro de 2015

"Balada de Neve", de Augusto Gil

Batem leve, levemente,
como quem chama por mim.
Será chuva? Será gente?
Gente não é, certamente
e a chuva não bate assim.

É talvez a ventania:
mas há pouco, há poucochinho,
nem uma agulha bulia
na quieta melancolia
dos pinheiros do caminho…

Quem bate, assim, levemente,
com tão estranha leveza,
que mal se ouve, mal se sente?
Não é chuva, nem é gente,
nem é vento com certeza.

Fui ver. A neve caía
do azul cinzento do céu,
branca e leve, branca e fria…
Há quanto tempo a não via!
E que saudades, Deus meu!

Olho-a através da vidraça.
Pôs tudo da cor do linho.
Passa gente e, quando passa,
os passos imprime e traça
na brancura do caminho…

Fico olhando esses sinais
da pobre gente que avança,
e noto, por entre os mais,
os traços miniaturais
duns pezitos de criança…

E descalcinhos, doridos…
a neve deixa inda vê-los,
primeiro, bem definidos,
depois, em sulcos compridos,
porque não podia erguê-los!…

Que quem já é pecador
sofra tormentos, enfim!
Mas as crianças, Senhor,
porque lhes dais tanta dor?!…
Porque padecem assim?!…

E uma infinita tristeza,
uma funda turbação
entra em mim, fica em mim presa.
Cai neve na Natureza
e cai no meu coração.

sexta-feira, 31 de julho de 2015

"The Cloud", de Percy Byshhe Shelley

I bring fresh showers for the thirsting flowers,
         From the seas and the streams;
I bear light shade for the leaves when laid
         In their noonday dreams.
From my wings are shaken the dews that waken
         The sweet buds every one,
When rocked to rest on their mother's breast,
         As she dances about the sun.
I wield the flail of the lashing hail,
         And whiten the green plains under,
And then again I dissolve it in rain,
         And laugh as I pass in thunder.

   I sift the snow on the mountains below,
         And their great pines groan aghast;
And all the night 'tis my pillow white,
         While I sleep in the arms of the blast.
Sublime on the towers of my skiey bowers,
         Lightning my pilot sits;
In a cavern under is fettered the thunder,
         It struggles and howls at fits;
Over earth and ocean, with gentle motion,
         This pilot is guiding me,
Lured by the love of the genii that move
         In the depths of the purple sea;
Over the rills, and the crags, and the hills,
         Over the lakes and the plains,
Wherever he dream, under mountain or stream,
         The Spirit he loves remains;
And I all the while bask in Heaven's blue smile,
         Whilst he is dissolving in rains.

   The sanguine Sunrise, with his meteor eyes,
         And his burning plumes outspread,
Leaps on the back of my sailing rack,
         When the morning star shines dead;
As on the jag of a mountain crag,
         Which an earthquake rocks and swings,
An eagle alit one moment may sit
         In the light of its golden wings.
And when Sunset may breathe, from the lit sea beneath,
         Its ardours of rest and of love,
And the crimson pall of eve may fall
         From the depth of Heaven above,
With wings folded I rest, on mine aëry nest,
         As still as a brooding dove.

   That orbèd maiden with white fire laden,
         Whom mortals call the Moon,
Glides glimmering o'er my fleece-like floor,
         By the midnight breezes strewn;
And wherever the beat of her unseen feet,
         Which only the angels hear,
May have broken the woof of my tent's thin roof,
         The stars peep behind her and peer;
And I laugh to see them whirl and flee,
         Like a swarm of golden bees,
When I widen the rent in my wind-built tent,
         Till calm the rivers, lakes, and seas,
Like strips of the sky fallen through me on high,
         Are each paved with the moon and these.

   I bind the Sun's throne with a burning zone,
         And the Moon's with a girdle of pearl;
The volcanoes are dim, and the stars reel and swim,
         When the whirlwinds my banner unfurl.
From cape to cape, with a bridge-like shape,
         Over a torrent sea,
Sunbeam-proof, I hang like a roof,
         The mountains its columns be.
The triumphal arch through which I march
         With hurricane, fire, and snow,
When the Powers of the air are chained to my chair,
         Is the million-coloured bow;
The sphere-fire above its soft colours wove,
         While the moist Earth was laughing below.

   I am the daughter of Earth and Water,
         And the nursling of the Sky;
I pass through the pores of the ocean and shores;
         I change, but I cannot die.
For after the rain when with never a stain
         The pavilion of Heaven is bare,
And the winds and sunbeams with their convex gleams
         Build up the blue dome of air,
I silently laugh at my own cenotaph,
         And out of the caverns of rain,
Like a child from the womb, like a ghost from the tomb,
         I arise and unbuild it again.

terça-feira, 14 de julho de 2015

Da Soror Mystica, de Dora Ferreira da Silva

Donzela sem espelho atenta ao seu tear,bordando pelo avesso dragão de irado olhar. A pétala e o donzel de leve suspirar,falcão preso á corrente , pavão a cintilar. Bordando pelo avesso o escuro parecer . o mal torna-se bem , a terra em florescer. A cor e seu contorno se encontram de repente e o olhar que nada vê só vê o que presente. Se fosse o mundo só a fria geometria, tão certa não seria a exata fantasia.Não fosse o desamor a mágoa que persiste, do amor não nasceria a bela face triste.Donzela que tão só teces o adivinhar, recria pelo avesso o pranto e o esperar.Partiu o cavaleiro em guerras a guerrear,tua mão traçando a prata recrie o seu voltar.

quarta-feira, 3 de junho de 2015

Para os Corações Partidos (Parte III)

Ex-bom é ex morto, dizem por aí. Mas, ao julgar pelo número de sessões espíritas e brincadeiras do copo feitas com frequência, deixar quieto aqueles que se foram é difícil para muita gente.

Parte III - O Armistício

Render-se a alguém é uma prova de amor. Frequentemente, contudo, é uma prova que não é pedida, mas sempre haverá aquela pessoa que será o seu ponto fraco. Ela faz você baixar as suas forças. Descuidar das suas costas. Expor o seu pescoço. E essa pessoa fará tudo isso sem esforço algum. E, queira o destino, essa pessoa terá, talvez, consciência do poder que ela exerce sobre você. Será a Lua, tão menor do que a Terra, capaz de imaginar a influência que exerce sobre ela e suas marés?

Entregar-se é abrir os portões. Mandar os arqueiros saírem dos muros, mandar destrancar a porta do castelo. Eventualmente, é claro, ó dó, nem todo mundo que nos causa baixa imunidade emocional é ataque benigno. Algumas patologias amorosas dão certo... Outras infeccionam.

Purgadas as dores e deixadas as cicatrizes, curado um mal o organismo, por um tempo debilitado, acaba por ficar mais forte. Como o que não mata tende a fortalecer, o resultado de amores acabados e dores profundamente sentidas levam à valiosa possibilidade de fortalecimento. Esse fortalecimento traduz-se de várias maneiras no período de vida pós-chute. Pode ser na forma da maturidade com a qual a próxima relação (porque haverá próximas) será conduzida. Pode ser na forma como você aprende a ceder certas coisas em certos momentos. Pode ser na forma como você não se deixa dominar sob certas circunstâncias. Pode ser na forma como você dá atenção e valoriza coisas pequenas e transitórias que antes passavam ignoradas na ânsia de viver grandes momentos que - surpresa - não aconteceram ou não acontecerão mais (pelo menos, não com a mesma pessoa).

Há, nas minhas linhas, uma quase tácita implicância com o ex-amor. Há esperança, chance de retorno? Seria simplório achar que não. Mas, respeitando-se a realidade, é bom trabalhar o presente tendo os futuros mais prováveis em mente. E, convenhamos, as tendências dos últimos séculos mostram que é melhor preparar a vida futura tendo por certa a hipótese de que o ex-amor foi e não volta mais do que guardar-se e edificar-se para uma quem-sabe-possível-utópica-redentora volta.

Por isso, parta do pressuposto que duas pessoas morreram. O casal morreu. O amor morreu. Os momentos bons morreram. As coisas bobas e legais feitas juntas já eram. Defunte-se do outro. Porque, se há algo certo e natural no futuro, é a certeza de que muitas mortes acontecerão ao longo da sua vida - Para que novos ciclos possam começar, os antigos devem terminar.

Mas as mortes ao longo da vida, várias, tendem a não ser literais. Nessas mortes faz-se velório de sentimento, enterro de emoção, cremação de lembrancinhas. As pessoas que participaram dessas mortes, normalmente, continuam vivas.

E como conviver no mesmo mundo com uma pessoa que, de um momento para outro, deixou de ser a fonte do seu maior prazer e alegria para tornar-se a sombra da sua felicidade, a fonte da sua dor e tormento?
Nem todo mundo manda pro inferno, e poucos magoados no amor conseguem fazer isso. Até porque no inferno fica quem foi chutado, abandonado, magoado. Resta, então, mandar o ex-amor para bem longe. E, pensando-se em lugar longe do inferno, resta mandar para o céu.

Pois é. Desejar que coisas boas aconteçam a quem mais lhe causou mágoa. Desejar que esse alguém vá para um bom lugar, com boa gente, fazer boas coisas vivendo boas experiências.
Muito mais fácil seria mandar pro raio que parta, mas é mais benéfico para a cura de um término de relação colocar-se, um pouco, no lugar de quem apunhalou seu coraçãozinho.

Em primeiro lugar, tende a não ser fácil para muitas pessoas terminar uma relação. Às vezes chega-se a um ponto onde um dos dois terá que tomar a iniciativa, virar o vilão e dizer que acabou.
É claro que reconhecer que terminar pode ter sido difícil para quem tomou a iniciativa, a dor em nada se compara a quem continua amando e não queria que acabasse. É por isso que é importante desejar a(o) ex coisas boas - porque você está tão mal que as coisas boas devem acontecer longe de você. E o que você mais precisa nessa hora é de distância da pessoa que mais lhe causou mágoa.
É preciso perdoar e se afastar. Tentar esquecer. A todo instante, porque a todo instante você pode lembrar ou ser fazer lembrar. Desejar que a pessoa esteja bem, inclusive bem longe de você, é um passo importante para se afastar da pessoa por uma necessidade sua, não porque você é um anjo querido que deseja bem até em quem lhe cravou o punhal nas costelas.

E, sobretudo, cara pessoa magoada, desejar o bem a quem não mais te quis bem é um passo fundamental para tentar viver o desapego. Desapegar-se é evitar sofrimento. Pode evitar a intensidade de uma gama de emoções em possíveis situações, bem específicas, mas em geral o apego, sobretudo entre pessoas, tende a causar grandes males se a pessoa não estiver pronta para um momento de separação.

Acontece - ó dó de novo - que mesmo quem está preparado para o momento de uma separação pode ser pego de surpresa por uma separação - por uma pequena morte - justamente em um momento em que não estava pronto para isso.

É preciso viver em paz porque é preciso ser feliz. A paz é uma conquista. Ironicamente, viver em paz requer lutas constantes. Vitórias pírricas. Saber ser estratégico e diplomata só tem a ajudar.

A pessoa que lhe causa dor pode, nem sempre, ser um inimigo merecedor de seu ódio e desdém. Talvez ela seja incapaz de amar você da maneira que você precisa. Se for, o problema está nela. E ela precisa de paz tanto quanto você;
Perdoe. Esqueça. Desfaça o vínculo. Bata em retirada. E faça as pazes com suas dores tão logo possível. Pode ser que você nunca leve uma bandeira branca ou um tratado de paz à pessoa, mas não se prepare para a guerra. Ao invés disso, edifique-se para viver a paz que você precisa.

Ter ódio, raiva, rancor, mágoa, sofrência... Tudo isso são maneiras de se manter apaixonado, de se manter ligado, mesmo que de maneira torturante, à pessoa desejada ou à relação falecida. Conseguir, aos poucos, perdoar e desapegar-se, é garantia de uma vida nova.

quarta-feira, 27 de maio de 2015

Para os Corações Partidos (parte 2)

Continuando uma série de palavras que, para você que sofre de amor, não ajudarão tanto quanto eu espero que ajudem

Parte 2 - Como continuar envenenado

Apaixonar-se é como pedir algo emprestado a alguém, pedir que tomem conta do seu lugar enquanto você vai até ali ou pedir que alguém te dê uns tapas nas costas antes de chamar o SAMU porque você está engasgado com algo mais seco que Pipoteca. São coisas da vida: Por mais que ninguém dependa disso em questão para a vida prosseguir e terminar, são coisas quase tão certas e inescapáveis quanto as rugas na sua cara ou os filmes da Xuxa.

Escolhas não são atos isolados. Elas pesam com responsabilidade. E pesam porque responsabilidade não é coisa passageira. É um uso de investimentos passados e um ato de se assumir riscos para o futuro. Optar, escolher, decidir... Se você, ao fazer isso, está com a cabeça só no presente, está mais exposto às surpresas da vida, essa menina travessa que mexe com quem está quieto.

Apaixonar-se, então, mesmo que não seja uma decisão, forçará você a usar mais o seu coraçãozinho do que seus neuroniozinhos acham cabível, e logo você estará tomando decisões que o levarão a se expor a grandes alegrias ou a terríveis decepções - em ambos os casos, a emoção será grande e marcante porque excederá suas expectativas e até mesmo sua imaginação de apaixonado(a).

Porém, em se tratando de assumir riscos, o chute, o fora, o chifre, a decepção, a desilusão, a quebra de cara, a mágoa, enfim, todo o falecimento do amor está na linha miúda do contrato que você assina quando diz sim pra outra pessoa e ela diz o sinzinho dela também. O relacionamento começa para durar e para as pessoas serem felizes. A vida na dimensão da realidade fatual é que não colabora...

Ao invés de listar mil e um motivos para determinar o que destruiu seu sonho de continuar ou melhor o relacionamento, e para evitar ficar listando mil e dois motivos para continuar insistindo ou mil e três motivos para tentar voltar (e, sobretudo, evitar ter mil e quatro esperanças de que as coisas vão se remendar magicamente), é bom botar a razão para funcionar. E, sendo racional, a hora passará a ser de listar alguns motivos para seguir em frente, motivos para encarar que a relação acabou, motivos para traçar novos planos para as horas do dia agora que é bem provável que o seu amor se foi. Ficar perdido nos devaneios do chute, é claro, em nada ajudará.

Mas aí vem a grande questão que merece a caixa-alta. SOFRER POR AMOR É UMA FORMA DE CONTINUAR APAIXONADO. Você tinha aquele vínculo tão lindo, tão doce e perfumado com a pessoa... Sentia-se até capaz de loucuras por ela, e por mais idiota que fosse pensar como seria bom e agradável viajar, fazer compras no supermercado ou ver filmes com a pessoa, o sentimento fazia bem. O vínculo era o poço que trazia a água. E de repente o vínculo se acaba. O poço não seca, você apenas não tem acesso a ele. A água continua lá. Tudo o que você passa a pensar é que morrerá de sede, que só aquela água é que matava sua sede, que a situação tem que ser contornada ou já era.
E por mais que essa cegueira momentânea e privação da capacidade de se salvar durem por um tempo preocupante em muitos casos, imagino que o principal veneno é, nessas horas, a esperança ilusória de que a pessoa que se foi magicamente voltará. Ou que ela esquecerá o que você fez e trará mil perdões consigo. E que, recomeçando a relação perdida, tudo será tão bom ou melhor quanto antes.

Se for para imaginar, imagine como seria barrenta a água de um poço arruinado, mesmo que você conseguisse cavar com as mãos para chegar até a água. Imagine como seria voltar para a pessoa ou a pessoa voltar para você. E, por mais que você imagine coisas boas, faça o exercício de imaginar como seria a confiança e o sentimento de segurança no relacionamento após esse retorno que brinca na sua imaginação. Como seria voltar a mostrar o pescoço para alguém que cravou a faca ali enquanto a ferida ainda nem fechou?

Wicked me, mas se a pessoa decidiu partir, parta também. Corte o vínculo. Desfaça-se de que se desfez de você. Esqueça quem considera te esquecer. Não crie caso por quem te achou dispensável e não vá atrás de quem optou por largar você. E não é uma questão de orgulho, porque de nada adiantaria ficarem sentados sozinhos, você e seu orgulho, enquanto sua vontade for correr até os braços de seu amor para que se beijem sob a chuva ou sob o pôr-do-sol.

Já que aquela cena linda do grande beijo público de vocês reatando ao som de aplausos e risos emocionados das pessoas ao redor não vai acontecer, esforce-se em livrar-se e purgar-se dessa coisa tóxica que fica impregnada no seu corpo quando a pessoa amada diz adeus. Toda a devoção que você tinha para entregar para essa pessoa vira o veneno que lhe fará continuar sofrendo com a expectativa da pessoa voltar. E, contando que ela não volte, esse veneno destruirá pouco a pouco a sua capacidade de imaginar como você poderá ser feliz com outras pessoas ou só consigo daqui a pouco tempo. Vai minando suas forças que você poderia estar usando desde já para reorganizar a sua vida agora que o seu benzinho disse adeus e não te liga.

Os Deuses gregos têm ícor correndo junto ao sangue de suas veias. É uma substância tóxica, fatal para os mortais. Caso um mortal um dia derramasse o sangue de um deles, morreria por causa disso. Feridas abertas de Afrodite deitam veneno também. Mas se Asclépio demonstrou algo, é que para todo mal existe uma cura.

terça-feira, 19 de maio de 2015

::: Para os Corações Partidos

Entristeceu-me saber que um vídeo muito bom sobre términos de relacionamento desapareceu do Youtube porque o cidadão que o fez, dono do canal, sumiu da net.
Há uma lua nova sombria sobre os relacionamentos de várias pessoas próximas a mim, e é estranho que eu esteja bem dos assuntos do coração quando essas pessoas estão mal. Uma invertida dos fios, porque normalmente o contrário era o comum.



Assim sendo, dedicarei tempo e palavras e expressão a colaborar como posso com aqueles momentos da vida em que a maioria das pessoas que dá a cara à tapa em relacionamentos onde há doação se encontra: A fossa escura do término, as dores no pé de quem chuta, as tristezas inconsoladas de quem levou o fora, a imprevisão do tempo de sofrimento. Aos pós-modernos: Tenho vivência. Sobrevivi a mais de um "o problema não é com você, é comigo."

Eis, então, aqui, um dia antes de Wotan's Day, o que pode ser uma primeira parte de "Para os Corações Partidos", em retorno grato, sobretudo, à ajuda prestada por várias pessoas ao longo da minha ainda curta vida quando fui eu que precisei de aconselhamento amoroso-transpessoal-curativo-quironiano-serenatadeamor.

::: Para os Corações Partidos: Como continuar caindo



Desde criança, se passa na cabeça um relacionamentozinho, é para ser uma coisa legal e duradoura por um momento de brincadeira. Você, na brincadeira, é o mais power dos Cavaleiros do Zodíaco e fantasia uma vida a dois com uma das Chiquititas, mas não tem muita noção do que significa isso na vida adulta. Eu, pelo menos, não conheço casos de crianças que ficam imaginando como é dar o fora ou receber o fora.

Mas o fora está aí para ficar e, nesse mundo em que ninguém é de ninguém, uma das maiores provas de que o ser humano é biológico é sua necessidade de cheirar o cangote alheio. A gente se entrega. E se dá mal por causa disso, de maneiras diferentes, muitas vezes, dentro e ao fim de relacionamentos. E vai ser sempre assim. Escravos e imperadores já sofreram por amor. Corsários e detetives (noir), machões e decoradores de espaço pet, verdugos e hortelões, a história está cheia de casos desconhecidos e para sempre ignorados de amores que deram mal. É humano quebrar a cara por causa disso.

Eu sou um apaixonado sem jeito, e espero fazer minha parte para preparar os outros para lidar com essas coisas também. Sempre falo aos alunos do sentido da palavra "amante": aquele que ama. Na tradição pela qual lutam os conservadores (do tipo bate-forte-a-panela que eu quero é tic-tic-tá), você casava por motivos de status, society, posses... E aí o homem tinha a amante, aquele a quem ele amava, que coincidentemente não era aquela a quem seus pais tinham prometido ou firmado contrato a respeito de matrimônio.
O fora vem, para o amor, tão certo quanto a morte vem para a vida. E se não é o fora definitivo, que pra vida seria um golpe de morte, é uma série de foras tênues que vão matando a relação, que pra vida seria como o maço de cigarros que você fuma todo dia pra enegrecer o pulmão direito.

Quem dá o fora tem sua parcela de dor e dúvida envolvida. Aprendi isso pensando em quem me deu o fora mais do que nas vezes em que quem deu o fora fui eu. Mas é claro que nada da dor de quem chuta se compara com a dor de quem é chutado.
E, para o chutado, sua dor vira uma obsessão.
Imagine um consultório médico lotado. Há um cara que levou um tiro no peito, um que levou um choque de muitocentos mil volts na veia, outro que foi atropelado por um caminhão da Elma Chips e chega você, que pisou em um prego. Dói pisar num prego, todo mundo sabe. Mas aquela dor só você está sentindo. Tão entranhada, tão ardida, está no seu corpo, marcando você por dentro. E o que você faz? Entra em desespero porque o médico está preenchendo uma ficha para o cara que levou o tiro. Você começa a ficar sem ar, a achar que vai morrer negligenciado, ou que foi estúpido e não conseguiu mostrar ao médico o quanto você precisa de socorro e alívio.
Na vida, você, que levou o fora, é esse cara que pisou no prego e está momentaneamente privado de entender a gravidade das suas dores. E está certo nisso. Até porque, na vida, o médico não existe nessa situação. Você vai ter que encarar a pisada no prego como acupuntura artesanal.

Nas horas depois do fora, que parecem não ter fim, um dos piores conselhos que alguém pode dar é "Pare de sofrer, tem tanta gente sofrendo coisas mais graves por aí". Na verdade, esse conselho é tão horrível que não serve em situação nenhuma. Cada dor é única e individual, parte de um ser humano único  nas experiências e singular em sua identidade. Talvez você que levou o fora sinta mais a dor de ter levado esse fora do que muita gente que sofre mundo a fora sente essa sofrência pessoal. Até porque saber que tem gente que sofre coisas piores do que você não deveria servir para animá-lo.

O fato é que todo e qualquer conselho nessa hora vai cair em orelhas quase surdas. O sofredor do fora só conseguirá escutar e reter aquelas poucas opiniões que o incentivarão a lutar por um amor perdido, ou que lhe darão esperança, ou que irão de encontro a suas ilusões ou esperanças. Todo o resto, por mais que sejam pérolas da razão e compreensão, não servem. Não servem porque são fruto da ótica de quem vê a situação de fora. Pra quem está sentindo o fora entrando pela pele essa visão está além do possível por um bom tempo.



Mas antes de falar dessa dor especial, escravizadora e viciante, termino falando algo que pode até animar, mas que espero que no fundo não faça muita diferença: Bem ou mal, até essa dor passa. Meses ou anos mais tarde você vê que não consegue mais sentir aquela velha dor e, mesmo que não diga para si mesmo, vai vislumbrar lá no fundo da mente algo do tipo "acho que perdi tempo demais naquela época sofrendo por aquele pescocinho" ou "como pude achar que não ia mais dar certo?" ou até "quem diria que eu ia parar aqui".

E por mais que para você, meu caro sofredor(a) do fora, eu dizer que o tempo, de fato, faz pequena essa sua dor que agora é tão grande não seja um conselho hábil, fique tranquilo. Naquela paz que é possível se encontrar quando está tudo tão ruim que parece que a vida inteira saiu dos eixos. Sofra enquanto der, porque a vida continua e não haverá, um dia, tanto tempo para essa dor quanto há agora.

Em tempo, há um teste embutido no segundo parágrafo acima desse trecho aqui. Um "ilusômetro", ou "esperançômetro". Quando eu disse que na sua mente pode passar "como pude achar que não ia mais dar certo?", analise:
1 - se você pensou que não ia dar certo com outras pessoas, parabéns, você já deu um passo decisivo para longe de quem não te quis mais: viu-se ao lado de companhia mais agradável.
2 - se você pensou que eu estava me referindo a dar certo com a pessoa com quem um dia deu errado... Talvez você precise trabalhar um pouco mais a sua "criatividade emocional". Falarei disso depois.


Até que eu volte a falar disso, fique bem o quanto puder na hora que der. E cuidando com as quedas, sobretudo de coisas frágeis e de material cristalino.
.
.
.

quinta-feira, 7 de maio de 2015

Orvalho para a alma


Orvalho para a alma.
Orvalho para a alma. Alguém já notou a semelhança entre as palavras alma e lama? Apenas uma brincadeira de filólogo, eu aposto. Pode até não ser, mas céus, ando tão cansado de etimologias, ando tão sem tempo para esforços e tão sem essa para complicações que deixa disso de rebuscar.

Não que eu despreze isso de ficar interrogando os porquês do que se fala o do que se escreve. Longe de mim afastar a gente da linguagem. Até porque, veja bem, é nela que se encontra asilo e conselho, um amontoado de sinais e uma ou outra variação de caminho que bem pode servir quando todas as outras ajudas não se mostram. A linguagem é melhor que os conselhos nos assuntos de alma e de lama, e se for na forma escrita ela fica um pouco menos insondável, um pouco mais segura, um pouco mais confiável.

E de tudo o que se lê por aí, no que tange a cura de almas ou apenas sossêgo na lama eu aconselharia o Neruda mesmo. Nem Bíblia, nem autoajuda nem Machado de Assis (este não me leve a mal, mas ele requer aquela razão paciente que não possui alguém partido a golpes de vida). Neruda, sim, porque ele vai da lama à alma e volta sem a gente perceber que foi movido.

É ou não é da cura falar que aquela flor que não abriu carregou, carregará e morrerá com a promessa de florir que, por não ter sido cumprida, ganhou a eternidade de um sonho? É ou não é da cura querer fazer crer que no peito onde ficou algo recolhido está uma promessa fecunda que, por não ter sido, sempre será? Um eternamente ser...

São as personagens, é cada eu-lírico, os heróis: Nenhum deles jamais nasceu, mas muitos são imortais. Por nunca terem sido realizados, ganharam a vida distinta, longeva e irreclinada na parecência com o mundo das ideias – um direito de viver, ainda que de forma brevemente perceptível, num espaço que é arte.

Eu ando assim, cavando alma e enaltecendo a lama. Procurando arte onde pode só haver confusão, sem aquela parte de história e de cumplicidade. Ou tentando apenas viver e ser cúmplice em momentos que são puro conto, pura arte. Se não estou vivendo em paz, leio. Se não leio, escrevo. É uma maneira, penso, de me fazer viver quando não estou sentindo vida. E de ajudar a viver quem um dia precisar recorrer a isso.


Eu ando assim, cavando alma e enaltecendo a lama. Ou às vezes é o contrário, quando não deixo disso de rebuscar. Há algo de inspirador nessas promessas boas que nunca se cumprem e que jamais hão de se cumprir. Não sei dizer ao certo o que é, porque me falham as certezas desde que comecei a fazer perguntas, mas creio que essa inspiração está em algum lugar entre a catarse e um olhar de soslaio que eu dispense àquela planta que nasceu, contra todas as adversidades, numa fenda indistinta no meio do concreto. Nela – nessa planta – na escrita e em mim há a mesma centelha de vida e de arte que, no ato de todos imitarmo-nos, afirma e reafirma que a vida persevera. Que a força vinga com a planta, com a personagem, com a alma. Se na lama. E a planta, talvez na lama, conquista o orvalho. Recebe o orvalho. Não vive da promessa dele, talvez. Fica na lama. Tem talvez sua alma. Orvalho na lama.


sexta-feira, 1 de maio de 2015

Gosto de Frio

Para mim, que gosto do frio, o problema do frio é que, no frio, aparecem também as coisas guardadas no frio. Ou esquecidas no frio. Na imobilidade do frio. Presas no gelo do frio.

Crise é desgelo. Caos é a queda da banquisa. Desespero, uma geleira que se rompe.
No frio (e eu gosto do frio), se está frio, vasculhar o que está trancado no frio é problema. É confusão. É o diabo.

Dizem que o inferno é quente. E não frio. Concordo, talvez. Mas há outros lugares para se estar. Esses sim, frios. Não são de castigo. Mas são frios. E infernais.

segunda-feira, 27 de abril de 2015

Das Águas

O Estige é bem mais cruel que o Mediterrâneo.
Os gregos, que cruzam azuis longos em seus barcos velozes, são humilhados pelo leito de um rio.

Corra-se pela praia, e dê-se o corpo às ondas, ao vendaval. Se carregado por barco, longe vá. Aporte. Conheça novas terras, novas pessoas, novos cheiros, novos velhos.

Mas o rio permanece intransponível. O Barqueiro, guardem-No os Deuses sempre em boa sorte, não é dado a piedades.

Mas se o castigo de Hades é ver logo ali, do outro lado do rio, a distância de uma vela só, aqueles amados perdidos que se vão e nas sombras deixam-se estar, o Deus Rico também sabe ser preciso e professor.

A distância do rio é curta de uma margem à outra para que a saudade passe a nado. Ou que a lembrança caminhe sobre as águas, jamais detida.

A piada cruel desse jogo de águas é que os corpos queimam e de um jeito ou outro se esfarelam, misturando-se às terras dos outros mundos. Mas a alma, ou que quer que seja isso e o que quer que sobre dela, está à distância de um pensamento.

E em se tratando de águas, por onde vão os desbravadores ou por onde chegam os invasores, ao invés de se visitar nas lembranças os amores e os amigos mortos, pode ser que eles venham aportar por um breve instante onde estamos. Mas nunca quando olhamos o mar.


domingo, 5 de abril de 2015

"One day she was discovered", by Michael Pastore

One day she was discovered
after her final breath
So honest in her lifetime
and yet she cheated death.
Undying in her goodness
enduring in her touch
immortal in her poetry
she loved so much.


~ by Michael Pastore
(to Emily Dickinson?)

quinta-feira, 26 de fevereiro de 2015

An Essay on Man, Epistle II ::: Alexander Pope

I.
       Know then thyself, presume not God to scan;
The proper study of mankind is man.
Plac'd on this isthmus of a middle state,
A being darkly wise, and rudely great:
With too much knowledge for the sceptic side,
With too much weakness for the stoic's pride,
He hangs between; in doubt to act, or rest;
In doubt to deem himself a god, or beast;
In doubt his mind or body to prefer;
Born but to die, and reas'ning but to err;
Alike in ignorance, his reason such,
Whether he thinks too little, or too much:
Chaos of thought and passion, all confus'd;
Still by himself abus'd, or disabus'd;
Created half to rise, and half to fall;
Great lord of all things, yet a prey to all;
Sole judge of truth, in endless error hurl'd:
The glory, jest, and riddle of the world!

       Go, wondrous creature! mount where science guides,
Go, measure earth, weigh air, and state the tides;
Instruct the planets in what orbs to run,
Correct old time, and regulate the sun;
Go, soar with Plato to th' empyreal sphere,
To the first good, first perfect, and first fair;
Or tread the mazy round his follow'rs trod,
And quitting sense call imitating God;
As Eastern priests in giddy circles run,
And turn their heads to imitate the sun.
Go, teach Eternal Wisdom how to rule—
Then drop into thyself, and be a fool!

       Superior beings, when of late they saw
A mortal Man unfold all Nature's law,
Admir'd such wisdom in an earthly shape,
And showed a Newton as we shew an Ape.

       Could he, whose rules the rapid comet bind,
Describe or fix one movement of his mind?
Who saw its fires here rise, and there descend,
Explain his own beginning, or his end?
Alas what wonder! Man's superior part
Uncheck'd may rise, and climb from art to art;
But when his own great work is but begun,
What Reason weaves, by Passion is undone.

       Trace science then, with modesty thy guide;
First strip off all her equipage of pride;
Deduct what is but vanity, or dress,
Or learning's luxury, or idleness;
Or tricks to show the stretch of human brain,
Mere curious pleasure, or ingenious pain;
Expunge the whole, or lop th' excrescent parts
Of all our Vices have created Arts;
Then see how little the remaining sum,
Which serv'd the past, and must the times to come!

II.
       Two principles in human nature reign;
Self-love, to urge, and reason, to restrain;
Nor this a good, nor that a bad we call,
Each works its end, to move or govern all:
And to their proper operation still,
Ascribe all good; to their improper, ill.

       Self-love, the spring of motion, acts the soul;
Reason's comparing balance rules the whole.
Man, but for that, no action could attend,
And but for this, were active to no end:
Fix'd like a plant on his peculiar spot,
To draw nutrition, propagate, and rot;
Or, meteor-like, flame lawless through the void,
Destroying others, by himself destroy'd.

       Most strength the moving principle requires;
Active its task, it prompts, impels, inspires.
Sedate and quiet the comparing lies,
Form'd but to check, delib'rate, and advise.
Self-love still stronger, as its objects nigh;
Reason's at distance, and in prospect lie:
That sees immediate good by present sense;
Reason, the future and the consequence.
Thicker than arguments, temptations throng,
At best more watchful this, but that more strong.
The action of the stronger to suspend,
Reason still use, to reason still attend.
Attention, habit and experience gains;
Each strengthens reason, and self-love restrains.

       Let subtle schoolmen teach these friends to fight,
More studious to divide than to unite,
And grace and virtue, sense and reason split,
With all the rash dexterity of wit:
Wits, just like fools, at war about a name,
Have full as oft no meaning, or the same.
Self-love and reason to one end aspire,
Pain their aversion, pleasure their desire;
But greedy that its object would devour,
This taste the honey, and not wound the flow'r:
Pleasure, or wrong or rightly understood,
Our greatest evil, or our greatest good.

III.
       Modes of self-love the passions we may call:
'Tis real good, or seeming, moves them all:
But since not every good we can divide,
And reason bids us for our own provide;
Passions, though selfish, if their means be fair,
List under reason, and deserve her care;
Those, that imparted, court a nobler aim,
Exalt their kind, and take some virtue's name.

       In lazy apathy let Stoics boast
Their virtue fix'd, 'tis fix'd as in a frost;
Contracted all, retiring to the breast;
But strength of mind is exercise, not rest:
The rising tempest puts in act the soul,
Parts it may ravage, but preserves the whole.
On life's vast ocean diversely we sail,
Reason the card, but passion is the gale;
Nor God alone in the still calm we find,
He mounts the storm, and walks upon the wind.

       Passions, like elements, though born to fight,
Yet, mix'd and soften'd, in his work unite:
These 'tis enough to temper and employ;
But what composes man, can man destroy?
Suffice that reason keep to nature's road,
Subject, compound them, follow her and God.
Love, hope, and joy, fair pleasure's smiling train,
Hate, fear, and grief, the family of pain,
These mix'd with art, and to due bounds confin'd,
Make and maintain the balance of the mind:
The lights and shades, whose well accorded strife
Gives all the strength and colour of our life.

       Pleasures are ever in our hands or eyes,
And when in act they cease, in prospect, rise:
Present to grasp, and future still to find,
The whole employ of body and of mind.
All spread their charms, but charm not all alike;
On diff'rent senses diff'rent objects strike;
Hence diff'rent passions more or less inflame,
As strong or weak, the organs of the frame;
And hence one master passion in the breast,
Like Aaron's serpent, swallows up the rest.

       As man, perhaps, the moment of his breath,
Receives the lurking principle of death;
The young disease, that must subdue at length,
Grows with his growth, and strengthens with his strength:
So, cast and mingled with his very frame,
The mind's disease, its ruling passion came;
Each vital humour which should feed the whole,
Soon flows to this, in body and in soul.
Whatever warms the heart, or fills the head,
As the mind opens, and its functions spread,
Imagination plies her dang'rous art,
And pours it all upon the peccant part.

       Nature its mother, habit is its nurse;
Wit, spirit, faculties, but make it worse;
Reason itself but gives it edge and pow'r;
As Heav'n's blest beam turns vinegar more sour.
We, wretched subjects, though to lawful sway,
In this weak queen some fav'rite still obey:
Ah! if she lend not arms, as well as rules,
What can she more than tell us we are fools?
Teach us to mourn our nature, not to mend,
A sharp accuser, but a helpless friend!
Or from a judge turn pleader, to persuade
The choice we make, or justify it made;
Proud of an easy conquest all along,
She but removes weak passions for the strong:
So, when small humours gather to a gout,
The doctor fancies he has driv'n them out.

       Yes, nature's road must ever be preferr'd;
Reason is here no guide, but still a guard:
'Tis hers to rectify, not overthrow,
And treat this passion more as friend than foe:
A mightier pow'r the strong direction sends,
And sev'ral men impels to sev'ral ends.
Like varying winds, by other passions toss'd,
This drives them constant to a certain coast.
Let pow'r or knowledge, gold or glory, please,
Or (oft more strong than all) the love of ease;
Through life 'tis followed, ev'n at life's expense;
The merchant's toil, the sage's indolence,
The monk's humility, the hero's pride,
All, all alike, find reason on their side.

       Th' eternal art educing good from ill,
Grafts on this passion our best principle:
'Tis thus the mercury of man is fix'd,
Strong grows the virtue with his nature mix'd;
The dross cements what else were too refin'd,
And in one interest body acts with mind.

       As fruits, ungrateful to the planter's care,
On savage stocks inserted, learn to bear;
The surest virtues thus from passions shoot,
Wild nature's vigor working at the root.
What crops of wit and honesty appear
From spleen, from obstinacy, hate, or fear!
See anger, zeal and fortitude supply;
Ev'n av'rice, prudence; sloth, philosophy;
Lust, through some certain strainers well refin'd,
Is gentle love, and charms all womankind;
Envy, to which th' ignoble mind's a slave,
Is emulation in the learn'd or brave;
Nor virtue, male or female, can we name,
But what will grow on pride, or grow on shame.

       Thus nature gives us (let it check our pride)
The virtue nearest to our vice allied:
Reason the byass turns to good from ill,
And Nero reigns a Titus, if he will.
The fiery soul abhorr'd in Catiline,
In Decius charms, in Curtius is divine:
The same ambition can destroy or save,
And make a patriot as it makes a knave.

IV.
       This light and darkness in our chaos join'd,
What shall divide? The God within the mind.

       Extremes in nature equal ends produce,
In man they join to some mysterious use;
Though each by turns the other's bound invade,
As, in some well-wrought picture, light and shade,
And oft so mix, the diff'rence is too nice
Where ends the virtue, or begins the vice.

       Fools! who from hence into the notion fall,
That vice or virtue there is none at all.
If white and black blend, soften, and unite
A thousand ways, is there no black or white?
Ask your own heart, and nothing is so plain;
'Tis to mistake them, costs the time and pain.

V.
       Vice is a monster of so frightful mien,
As, to be hated, needs but to be seen;
Yet seen too oft, familiar with her face,
We first endure, then pity, then embrace.
But where th' extreme of vice, was ne'er agreed:
Ask where's the North? at York, 'tis on the Tweed;
In Scotland, at the Orcades; and there,
At Greenland, Zembla, or the Lord knows where:
No creature owns it in the first degree,
But thinks his neighbour farther gone than he!
Ev'n those who dwell beneath its very zone,
Or never feel the rage, or never own;
What happier natures shrink at with affright,
The hard inhabitant contends is right.

VI.
       Virtuous and vicious ev'ry man must be,
Few in th' extreme, but all in the degree;
The rogue and fool by fits is fair and wise;
And ev'n the best, by fits, what they despise.
'Tis but by parts we follow good or ill,
For, vice or virtue, self directs it still;
Each individual seeks a sev'ral goal;
But heav'n's great view is one, and that the whole:
That counterworks each folly and caprice;
That disappoints th' effect of ev'ry vice;
That, happy frailties to all ranks applied,
Shame to the virgin, to the matron pride,
Fear to the statesman, rashness to the chief,
To kings presumption, and to crowds belief,
That, virtue's ends from vanity can raise,
Which seeks no int'rest, no reward but praise;
And build on wants, and on defects of mind,
The joy, the peace, the glory of mankind.

       Heav'n forming each on other to depend,
A master, or a servant, or a friend,
Bids each on other for assistance call,
'Till one man's weakness grows the strength of all.
Wants, frailties, passions, closer still ally
The common int'rest, or endear the tie:
To these we owe true friendship, love sincere,
Each home-felt joy that life inherits here;
Yet from the same we learn, in its decline,
Those joys, those loves, those int'rests to resign;
Taught half by reason, half by mere decay,
To welcome death, and calmly pass away.

       Whate'er the passion, knowledge, fame, or pelf,
Not one will change his neighbour with himself.
The learn'd is happy nature to explore,
The fool is happy that he knows no more;
The rich is happy in the plenty giv'n,
The poor contents him with the care of heav'n.
See the blind beggar dance, the cripple sing,
The sot a hero, lunatic a king;
The starving chemist in his golden views
Supremely blest, the poet in his Muse.

       See some strange comfort ev'ry state attend,
And pride bestow'd on all, a common friend;
See some fit passion ev'ry age supply,
Hope travels through, nor quits us when we die.

       Behold the child, by nature's kindly law,
Pleas'd with a rattle, tickl'd with a straw:
Some livelier plaything gives his youth delight,
A little louder, but as empty quite:
Scarfs, garters, gold, amuse his riper stage,
And beads and pray'r books are the toys of age:
Pleas'd with this bauble still, as that before;
'Till tir'd he sleeps, and life's poor play is o'er!

       Meanwhile opinion gilds with varying rays
Those painted clouds that beautify our days;
Each want of happiness by hope supplied,
And each vacuity of sense by Pride:
These build as fast as knowledge can destroy;
In folly's cup still laughs the bubble, joy;
One prospect lost, another still we gain;
And not a vanity is giv'n in vain;
Ev'n mean self-love becomes, by force divine,
The scale to measure others' wants by thine.
See! and confess, one comfort still must rise,
'Tis this: Though man's a fool, yet God is wise.